ALGOLAGNIA

DESPERTA menina, tenho algo a te dizer/Estamos em março, na escola, volta as aulas/Tu não vais nela aprender/O amor, não sabes nem de longe o que é/Comigo, talvez sim, você vai aprender/Quantas vezes serás abusada/Quantas vezes não dirás nada/Na escola da vida, sem saber/Terás muito, quase nada, a aprender/Dentro de sua casa terás a falsa sensação de que/Um dia a lição de casa vais fazer/Quem diz te querer bem/Acredite, não te quer ver com olhos de bem-querer/Chegaste à idade de verter/O primeiro sangue que os vampiros do ar/Irão beber/Você se levará para longe/Quando a casa em seu coração ruir de vez/Não haverá sermão de igreja/Nem palavras de pastor fora do tempo/Que sejam capazes de minimizar teu horror/A criança em teu ventre/Ela estará tal qual sempre estiveste/Sozinha/Seu coração gostaria de que alguém o roubasse/Para que te sentisses/Menos amargurada/Qualquer movimento em ti dói/O sol da manhã queimou tua pele como nos filmes de vampiro/Teus olhos pela primeira vez viram o horizonte/Queres persuadir-te de que podes te salvar da maldade do mundo/Seu coração te conduziu para longe de casa/O corpo amoroso que te restou ficou sozinho/Tudo o que podes fazer por ti/É poder sair desse pergaminho/Em que estarás sempre enquanto vítima/Nem sabes ao certo como chegaste até aí/Tutela, costela e mãe de outra menina/O bebê sorrir para ti/Tu, com lágrima no olho vê tudo que na vida dela porvir/Ninguém pode fazer mais do que já fizeste por ela, por ti/Do que jamais farás por ela/Parir/Ela que ganhe a vez de ser querida/Nascer é estar pela bola sete na sinuca da vida/Teu rosto é a metáfora de todos os rostos adolescentes/A mágoa virá, cedo ou  tarde, abrir mais tua ferida/Quisera eu fazer o milagre de ver feliz teu rosto/Libertar-te dos mil encostos/Fazer você voltar para a casa que nunca existiu.