A MULHER QUE CHORA — PICASSO (1937)
A MULHER QUE CHORA — PICASSO (1937)
VOCÊ, CARO LEITOR, está sendo solicitado à participação na compreensão destes textos. Para compreendê-los é preciso sair de uma atitude passiva de leitura. Para você, o que quer dizer o teto anterior: Criança Com Pomba”??? A garotinha com juízo inclinado, prende a pomba contra o peito. O pássaro representa a única proteção emocional que ela possui no mundo. Está sozinha em busca de âncora para sua barca no mar revolto de todas as vidas em seu derredor. Ela sugere carinho. Ela quer carinho.
NESTE PRESENTE TEXTO ela cresceu. Tornou-se “A Mulher Que Chora”. Talvez por lhe faltar compreensão, atenção, ternura. Tudo nela é deformação. Ela busca uma imagem inteira de si mesma, mas seus reflexos no espelho não sugere mais que imagens suas sobrepostas. O lenço está sendo mordido. Sugere ansiedade, inquietude, aflição e tristeza.
TALVEZ ESTEJA A aceitar o se despir e despedir de suas esperanças. As cores que se desassemelham entre si, sugerem conflitos e lágrimas saem dos olhos. O chapéu, o cabelo, os olhos, a boca, o nariz: tudo nela é pranto e dissonância. A aparência nos diz muito sobre a personagem literária Edinah. Afinal, é ela que estamos observando. Seus sonhos derreteram, quem poderá salvá-la da ruína. Por mais que sua aparência externa possa ser retratada com tintas de uma garota modelo propaganda de lançamento de perfume francês, sua imagem interior, ela sabem desespero, não pode nem deve enganar-se ela mesma.
DE ALGUMA FORMA Ednah, é submissão à condição que ela mesma criou para si. Seus filhos que não pode submeter às suas peculiaridades. Os referenciais de sua criação envelheceram terrivelmente rápido. Ela, cada vez mais se convencer da realidade de que ser mãe não é uma brincadeira de “bom barquinho”. Ela sabe que seus filhos vão crescer, não obstante gostaria de tê-los para sempre crianças, bonecos e bonecas manipuláveis. Ela sabe que um dia eles vão ter de encarar seu rosto com suas faces destorcidas. Que terá ela a dizer àquelas crianças que se tornaram adultas???
EDINAH NÃO VAI mais querer mesmerizá-las com a sonoridade infantil das canções, tipo: “Bom barquinho/bom barquinho/deixa nós passar/carregado de filhinhos/para ajudar Jesus criar/eu peço ao bom barquinho/licença para passar/eu tenho/muitos filhinhos/não posso mais/não posso mais tempo demorar/bom barquinho/bom barquinho/deixarás passar/carregado de filhinhos/quem vai ajudar a cuidar/eu peço/oh bom barquinho/licença para passar/eu tenho muitos filhinhos/pra Jesus criar...”.
AS CANÇÕES INFANTIS, as cantigas de roda, o mesmerismo materno cantado com uma tonalidade de voz superlativamente emotiva, que atraía como uma esponja a emoção infantil dos filhos, como se quisesse fazê-los justificar suas manias, seus distúrbios, a perturbação e os vícios trazidos da convivência traumática infantil que ela viveu com irmãos, primos, parentes, vizinhos... Não poderia ela ter evitado impor sua vontade de parir um outro filho todos os anos??? Não sabia ela que a vida miserável que teve em seu convívio familiar, ela deveria fazer de tudo para evitar??? A pulsão mórbida por se sentir empoderada “rainha do larbirinto” era mais forte que uma mínima noção de racionalidade.
O MARIDO, O VELHO que já nascera velho, ela sabia ser ele fraco e escatológico. Ela, Edinah, não ouvia os conselhos de ninguém. Dizia que a vida era dela e que saberia educar os filhos conforme havia sido educada. Não se via mais uma Mãezona da zona de pobreza nordestina, cuja família nunca saiu dos limites de sobrevivência, o mais indigente.
ELA NÃO QUERIA NEM saber: lançaria a mim, principalmente, no abismo de suas carências, sempre querendo convencer-me de que ser o desvalido cardinal da mamãezinha, era um grande privilégio que eu teria de aceitar como se fosse um prestigioso augúrio proveniente do caldeirão das bruxas de sua família de desvalidos. Sua cultura era aquela das mulheres que foram criadas para ser donas de casa: abrir as pernas, fazer café, lavar louças, cuidar da casa e se manter ignorante de tudo que fosse uma solicitação de qualidade de vida, mérito, honestidade de propósito, dote de inteligência.
PARA OBTER UM LUGAR onde pudesse garantir três refeições por dia, Mãezona tinha de, primeiramente, escravizar o marido e fazê-lo trabalhar de manhã, de tarde e de noite, enquanto o empanturrava de responsabilidades muito além de suas forças e possibilidades de manter uma família todo ano, cada vez mais crescida de necessidades de alimentação, educação, vestimentas e suprida unicamente de precariedades.
MÃEZONA ERA MOVIDA pela pulsão de parir, porque parir para ela, era aquela pomba que a criança que ela foi, por nunca ter crescido emocional e intelectualmente, ainda na idade adulta, no pássaro agarrado ao peito se refugiava desesperadamente, como se não soubesse ter crescido em idade cronológica. Ela continuava a ser a “Criança com Pomba” a se segurar na maternidade enquanto forma de afirmação de vida. Sempre ignorando, propositalmente, que eu, filho primeiro, precisava de que ela e o marido investissem em minha educação básica, em meu futuro.
MAS, ELA ESTAVA ocupada em manter, ainda que precariamente, um lugar para devorar três ou quatro refeições por dia, jogar buraco com vizinhos, lançar conversa de ciranda, cirandinha fora, e exercitar-se na alienação distraída de uma velha carcomida pela abundância de motivações alucinadas que alimentavam a mente tresloucada.
(P.S: TEXTO DO LIVRO "ONDE A LUZ DA LUA ME VÊ BRINCAR").
DECIO GOODNEWS
Enviado por DECIO GOODNEWS em 06/02/2023