CRIANÇA COM POMBA — PICASSO (1901)

EDINAH FAZIA JUSTIÇA AO significado de seu nome: alegria, encanto, rejuvenescer. Se algum prazer tirava de seus programas libidinais, carnais, voluptuosos, era o de se sentir livre da companhia com quem estivera e poder encarar a possibilidade de continuar a viver a vida com as possibilidades que a ela se apresentassem. Ela não se perdia ao entrar na selva escura do sol negro e sem saída do animal selvagem que subscrevera em seu corpo a marca ancestral de suas taras. Não se permitirá desfigurar uma realidade já por demais desfigurada.

A MORTE DE SEUS SENTIDOS não se permitiria conceder. Ao se lavar na água do chuveiro próximo, eis que a empatia de sua estranha e suposta dádiva, sua vida, escorria pelo ralo do banheiro, conduzida ao esgoto mais subterrâneo como nunca se houvesse perpetrado. Sua existência se permitia restringir à vida mundana, ao se abrir às suas influências deletérias. Mesmo que não pudesse buscar virtudes numa cultura de submundo, ela simplesmente se deixava consumir pela metodologia erótica da Serpente.

A BARBÁRIE DA LIBIDO, escatologia bíblica de Sodoma e Gomorra, acontecia nela com uma fragilidade física cada vez mais tênue. Nela, uma mulher embrutecida pelos eventos de sua história pessoal de necessidade e pobreza física e espiritual. Tudo que ela conheceu em sua educação era produto híbrido de uma sociedade subjugada pelos colonizadores pela cultura supremacista da Europa. Ela era produto da esponja de espermas que havia lançado seus ancestrais na indigência material e do intelecto.  

SUA FILIAÇÃO HAVIA ficado na dependência de favores de terceiros mais bem  situados na política de favores, no compadrismo da vizinhança, nas relações familiares com um marido que não parava de hostiliza-la e de por ela ser hostilizado. Viviam ambos de sobreviver. E lançaram as crias que de suas entranhas saíram na mais perversa dependência de terceiros. Sua única aptidão era parir. Quando grávida sentia-se menos inútil. Chamava a atenção de todos para o barrigão inchado que a tornaria genetriz mais outra vez.

TUDO O QUE ELA QUERIA na vida era ser o general quatro estrelas da caserna larbirinto. Aquartelar suas crias sob seu domínio à sombra da patologia  do pederasta do marido. Quanto mais soldadinhos houvesse aquartelados em seu “lar doce lar”, mais ela se sentia segura ao saber que aquele pobre animal escravizado pela trabalho de alimentar, vestir e fornecer educação à uma quantidade cada vez maior de estômagos para matar a fome de nutrição do complexo da empresa familiar.

ELA BUSCAVA EM SUA subjetividade defensiva, livrar-se das mazelas e da crise existencial e moral que avassalava de modo imperativo as mulheres de todas as classes sociais, nivelando a percepção de si mesmas e também das demais, como se fossem personalidades robóticas da mitologia do Paraíso Perdido. Ela e suas amigas pareciam estar em busca do milagre que poderia salvá-las delas mesmas, de suas realidades.

AS REALIDADES SE deterioravam a partir da vivência básica, dessa escatologia dos últimos dias de Pompéia. A prática da sexualidade assimilada por todos como se fosse um conceito historicamente determinado pelo erotismo reducionista, que não pode ser conjurado pelos amantes, nem tampouco reduzido à simples explicação, sem que o exercício de sua realidade se convertesse em mórbida insensatez: namoro, noivado, enxoval, cerimônia de casamento.

AS TRAMAS E O FUQUE-fuque nas camas teriam de ser encarados no realismo adamado de uma masculinidade para inglês ver. As ciências físicas e biológicas, as escolas e os cursos universitários não tinham pesquisado o porquê da deterioração reducionista da excitação decadente da libido. A luxúria em pouco tempo não se sustentaria mais, exceto em simulações da energia vital depauperada pelo subdesenvolvimento das condições familiar e social regidas pelas carências.

A CONFIGURAÇÃO ERÓTICA da sexualidade havia-se arruinado com as solicitações draconianas do consumismo regido pelo capitalismo selvagem. As mulheres não exerciam mais aquele antigo poder desenvolvido ao longo dos séculos passados, que prendia seus filhos na redoma da masturbação em vista de uma possibilidade de conto de fadas vir a se realizar: o Pequeno Príncipe do larbirinto haveria de encontrar sua Cinderela, com essa gata do braseiro haveria de ser feliz para sempre.

QUEM PODERIA PENSAR-SE livre dos encargos dos empregos, do relógio de ponto dos salários, do pagamento das contas de água, luz, dos alicerces de sustentação das despesas do lar doce lar e seus eletrodomésticos que cedo se tornariam obsoletos??? Quem poderia burlar as solicitações admiráveis que desafiavam a todos nos intervalos da programação do fantástico???

AQUELE ANTIGO GLAMOUR das mulheres, exercido sobre a condição carente dos meninos castrados, dos rapazes das bandas, dos jovens impotentes e deslumbrados pela necessidade de se sujeitar às imposições da ordem e do progresso do comércio e da economia, a exigir deles uma energia vital de super-homem, a intensidade de uma força somente possível na ficção, aquele magnetismo feminino, aquela simpatia pelas xotas, que motivava os punheteiros, arrefeceu no céu da “Nova Era" da libido LGBTQI++”.  

NINGUÉM MAIS NASCERIA homem. As mulheres não passariam mais de um truque de mágicas que não mais tiravam coelhinhas das cartolas. A “Nova Era da Escatologia” havia chegado. O que aquele casal desinformado de tudo poderia fazer, senão tentar, de todas as formas, submergir na própria ignorância, estupidez, na magia negra de seus antepassados que de há muito haviam descido ás tumbas dos cemitérios??? Não mais funcionava nos filhos a mente perversa, manipuladora, sedutora e superior com base na educação familiar alicerçada em mentiras rituais do lar e discursos “da política’.

(P.S: TEXTO DO LIVRO:  ONDE A LUZ DALUA ME VÊ BRINCAR).