50 Dias De Censura Ao Jornal O ESTADO DE SÃO PAULO
O direito fundamental das pessoas, dos eleitores, à cidadania, à informação, é cláusula pétrea da Constituição? Ora, se as instituições políticas e as do judiciário não servem para melhorar a vida das pessoas, dos eleitores, respeitando-lhes a cidadania, então não servem para nada. Exceto para privilegiar os privilegiados e garantir-lhes a tirania e a impunidade.
Há um absurdo surrealista vigente nas supremas cortes do judiciário. Senão, como explicar que o juiz do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, o que infligiu a censura prévia ao jornal O ESTADO DE SÃO PAULO tenha sido declarado suspeito por manter associações íntimas com a família Sarney e ao mesmo tempo o Conselho Especial do TJ-DF tenha mantido a liminar, a decisão arbitrada por ele?
A censura ao jornal O ESTADO DE SÃO PAULO, na opinião de advogados, juristas, promotores, desembargadores, juízes do Supremo Tribunal Federal, configura-se uma tirania jurídica, desde que infringe o princípio constitucional da liberdade de imprensa. Se a “onda” pega, a constituição passa a ter valor secundário nos atos dos tribunais de justiça e outros, com relação ao poder político arbitrário de grupos oligárquicos que fazem prevalecer a lei do vale-tudo das influências de grupos que desejam fazer prevalecer a qualquer custo sua vontade de poder, seu fanatismo e intolerância.
Por dez votos a dois o conselho do TJ-DF acolheu o primeiro agravo do ESTADÃO ao admitir que ele, Dácio Vieira, ex-consultor jurídico do Senado e desembargador desse tribunal, “gerou uma insegurança na permanência de imparcialidade”. Ou seja: o Conselho do TJ-DF retirou o desembargador do caso, mas, ao mesmo tempo, alegou que ele se tornou suspeito depois de ter concedido a liminar de censura conforme ação de Fernando Sayney impedindo a divulgação pelo jornal de reportagens sobre as negociatas investigadas pela Polícia Federal nas empresas da família do presidente do Senado.
Ora, todos sabem que a suspeição se caracteriza enquanto tal desde muito anteriormente à liminar do desembargador Dácio Vieira. A amizade deste com a família Sarney é de longa data. Ao admitir a suspeição o TJ-DF teria de, no cumprimento da lei, promover a anulação imediata da liminar que originou a censura. O Art. 285 do regime interno do Supremo Tribunal Federal afirma: “Quando se reconhece a suspeição do juiz, são nulos todos os atos por ele praticados.”
É o que diz a lei: “É suspeito o juiz que tem amizade íntima com uma das partes”. Reconhecida a suspeição pelo Conselho do TJ-DF, o certo, conforme o preceito jurídico, era tornar nula a decisão de censurar o jornal, tomada pelo juiz suspeito. A lei foi desconsiderada, relegada a segundo plano, secundarizada, num movimento claramente corporativista. Os colegas de tribunal do desembargador resolveram que prestigiá-lo era mais importante do que cumprir a lei. O Conselho considerou que o regimento interno do STF era de somenos importância com relação ao corporativismo incestuoso que manteve a liminar da censura pelo TJ-DF.
O ministro do Desenvolvimento Miguel Jorge em reportagem à mídia escrita disse que a censura da ditadura estava sempre presente na redação do jornal ESTADÃO, mas que essa censura do desembargador “se configura numa censura muita mais grave porque uma censura envergonhada, sobre a qual se tem pouca ação. A não ser se reclamar nos foros internacionais. É uma vergonha que se tenha de passar por esse tipo de coisa”. Segundo opinião do jurista Luiz Flávio Gomes “a censura ao ESTADÃO foi um ato ilegítimo que viola a Constituição brasileira e o sistema democrático vigente no país”.
Reconhecida a suspeição do juiz, “qualquer pessoa que tenha domínio mínimo na área do direito vai reconhecer que a consequência é esta: a insubsistência do ato praticado”. São palavras do ministro do supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello. O desembargador censor, reconhecidamente parcial em sua decisão de amordaçar o jornal ESTADÃO, foi conivente com a tentativa frustrada do senador Sarney (com o qual mantem associação íntima de interesses mútuos) de jogar a opinião pública contra a garantia constitucional de divulgação de informações pertinentes ao noticiário informativo dos leitores do jornal, asseverada pela Constituição.
São cinquenta dias de mordaça inconstitucional. Vale lembrar as palavras de um senador que hoje lhe fornece apoio, mas que no passado, quando de sua campanha eleitoral, assim se expressou relativamente ao atual presidente do Senado: “Estou falando de um irresponsável, um omisso, um devastado, um fraco... Um cidadão de más intenções que não dignifica o cargo que ocupa... Um dos piores presidentes que esse país teve a infelicidade de ter... O senhor sempre foi um político de segunda classe... O senhor pegou uma carona na história beneficiando-se de uma tragédia que emocionou o país... Passou todo o tempo de seu governo apadrinhando seus amigos e familiares, muitos dos quais sendo processados por atos de corrupção... O senhor está apostando no caos, na bagunça, no quanto pior melhor... O senhor quer instalar o tumulto... Um senhor é um ditador de opereta...”
O discurso de há duas décadas do então candidato Collor é muito mais extenso e agressivo. As frases acima foram reproduzidas dele, que agora está a apoiar os atos secretos do atual presidente do Senado. Os que ontem se excluíam mutuamente e se acusavam das mais depravadas prevaricações políticas, agora se prestam apoio mútuo às vistas largas da TV Senado para que todos os eleitores brasileiros brasileiros possam presenciar que os interesses mudam de lado conforme as conjunturas políticas do momento. Os que ontem se defenestravam jogando-se reciprocamente pela janela da história, hoje se ufanam de estar do mesmo lado. Apoiando-se ufanisticamente.
O ex-presidente da República impeachado pelos brasileiros brasileiros, agora está a prestar apoio incondicional ao presidente do Senado. É de se supor que ambos se mereçam. E que seus eleitores de ontem jamais os esqueçam. Que tipo de eleitores (esses “representantes do polvo, dos tubarões e das lullas”) votaram nelles? Aqueles que de tão necessitados e culturalmente miseráveis, sem educação pertinente, em troca de uma dentadura, de uma chinela japonesa ou de uma esmola de setenta a cento e quarenta reais, mantem suas famílias atreladas ao cabresto eleitoral em tempo de Bolsa Família das eleições.
Talvez seja por isso que os políticos não estejam interessados em promover a educação dessas gerações que vem e vão como se fossem o pêndulo trôpego de um relógio institucional que marca as horas de uma tensão social que, na impossibilidade de agravar-se mais, se permite cair no fosso aberto de todas as sacanagens institucionais que assolam ao som do mar e à luz do céu profundo seus eleitores carentes de educação pertinente ao exercício da cidadania.
E os discursos políticos da “elite” vem e vão conforme os interesses de classe e da oligarquia inconstitucional do momento. E o futuro dessas gerações espelham a grandeza de suas aspirações e ao mesmo tempo a baixeza com que são desprezadas pela perversidade paleolítica de seus representantes na Casa Grande Senado.
A educação da Senzalla sempre é adiada para um futuro algures. Depois de seus mandatos serem vencidos pelos interesses datados do palanque do dia. E os velhacos herdeiros das velhas oligarquias de pai para filho desde a chegada das caravelhas de Cabral, teimam em manter seus privilégios (“custe o que custar”) e a impunidade jurídica de oligarquias cada vez mais incestuosas perante as leis. As leis dos oligarcas que afirmam covarde e perversamente seu poder político a partir do domínio maquiavélico sobre a servidão voluntária dos excluídos. Órfãos de tudo. Exceto dos discursos oportunistas. Órfãos de tudo: exceto da demagogia e da pedofilia política.
DECIO GOODNEWS
Enviado por DECIO GOODNEWS em 30/07/2010