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Sator Arepo Tenet Opera Rotas
Tinha vergonha dessa sociedade. Vergonha de sua geração, fazendo a jogo político e econômico de uma sociedade estruturada de modo incongruente. Considerava-se um marinheiro trôpego da nau fantasma do capitalismo selvagem. Observava a multidão como se esta fosse uma manada de antropóides na azáfama de ganhar papel moeda. E para ganhar algum qualquer deles seria capaz de qualquer coisa.

A multidão de sonâmbulos precisava criar toda espécie de carma não apenas para si, mas para toda sua descendência. Conseqüência de pensamentos e ações falhos. Como livrar-se dessa falta de identidade implacável, das influências sensitivas de uma coletividade que parece não conhecer a semente que dê origem a árvore dos frutos transcendentes. Que "sorte" a dele. Nascer nesse planeta, parte dessa cultura primata.

Sereno trabalha como programador Cobol em uma central de processamento eletrônico de informações. Executa serviços a um sem número de empresas comerciais, industriais e bancárias. Estava em uma fase pessimista da existência. Com 45 anos e não sabia porque se inquietava com razões e motivações existenciais próprias da juventude. Seria isso um presságio?

Em outro lugar na cidade de São Paulo, Klone, um alienígena natural do sistema de dupla estrela Ypsilone do Boyero, ruminava a certeza de que, em breve, a nave aterrissará, visando entre muitos outros objetivos, buscá-lo para outra jornada de experiências científicas e observações em outros sistemas solares.

Outra vez trabalharia nos primeiros passos da colonização biológica de algum planeta longínquo em alguma galáxia a bilhões de anos-luz dessa Via-Láctea. Novamente seria uma espécie de professor orientador de raças símias. Investindo na transformação das estruturas químicas do código genético dos primitivos. Trabalharia um gen específico de determinados cromossomas. A promoção de algumas mutações artificiais dirigidas.

Em alguns milhares de anos, outros seres ultraprimitivos descobririam a penicilina e o tubo de raios catódicos que nivela por baixo a conduta inconsciente: a tv. Criarão, conforme o tipo de desdobramento mutativo ("mutatis mutandis"), dedicar-se-ão a correr atrás de papel-moeda, sobrevivendo no habitat primário em perene estado de excitação utópica.

Klone dirige um carro alugado na agência Avis, em direção a uma região montanhosa e semideserta. Saiu do aeroporto internacional de Cumbica em direção ao local de aterrissagem do objeto interestelar. Dirigia sem pressa. Vinham buscá-lo. Desta vez permanecerá na Terra, para pasmo de seus companheiros aliens. A vida perderia em substância? Talvez. A relatividade das atitudes. Afinal, todas as coisas existentes são interdependentes. E ele é uma dessas coisas.
Haverá perda de qualidades essenciais, diluição de redes neuronais.

A alternativa considerada uma ação limite, exige uma coragem e um desprendimento mitológicos. Klone teria muito a perder. Não mais veria as paisagens planetárias inusitadas, a entrada da nave em sistemas estelares de galáxias distantes. Nem participaria dos "safáris" de captura nem dos riscos da transferência de animais selvagens de um para outro planeta. Ou da colheita de espécies do reino vegetal para determinadas regiões que estariam em estado de receptividades primitivas, apropriadas para o desenvolvimento de ovos e cultura de microorganismos e outras células vivas.

Klone, originário de um sistema de dupla estrela, a maior das quais com sete planetas girando em contínua translação e rotação em torno de um sol central. Seu planeta de origem é o sexto. Ele possui dois satélites naturais. O quarto planeta possui três satélites naturais, o primeiro e o terceiro, um satélite natural cada.

No início da década de trinta uma sonda espacial proveniente de sua nave foi posta a girar em torno da lua, no planeta Terra. Houve tentativas de contato via rádio. A maneira pouco amistosa e sensacionalista com a qual cientistas e a imprensa desse planeta começaram a divulgar a possibilidade de contato, possivelmente causaria pânico. E logo estava descartada.

Hoje, os estudos sobre o desenvolvimento das comunidades humanas em suas relações com o meio ambiente e a conseqüente adaptação a ele, mostram a necessidade urgente da criação e uso de novos processos tecnológicos. Sem que estes processos sejam viabilizados a médio prazo as condições de sobrevivência planetária não poderão ser garantidas a longo prazo. Para que essas condições aconteçam, ele ficará.

Ou seja: sem ele, Klone, o futuro da raça humana será duvidoso. Se a cultura da guerra-fria bacteriológica continuar nesse ritmo, em breve este planeta mudará de mãos. Em sentido figurado. Afinal bactérias, vírus e outros microorganismos afins, não têm exatamente o segmento terminal de cada membro superior que se segue ao punho em seres humanos.

Segundo pesquisas do pessoal da equipe da nave, em 2013 a mortalidade entre humanos terá alcançado um índice auge (apogeu), em decorrência de uma nova virose com alto grau de transmissão infecciosa. Em outubro de 2009 sua missão em Terra estaria terminada. Ele resolveu permanecer.

Não há como ficar na Terra sem desobedecer aos contratos de permanência limitados no tempo. Em idade remota, com as intervenções de equipe da nave, os trabalhos de campo dos cientistas incluíam a inseminação artificial com vista a provocar a longo prazo, mutações genéticas que permitissem à raça símia dá origem aos primeiros membros da raça humana. À 5ª raça raiz terrena.

Alguns ancestrais naquele tempo longínquo permaneceram nesse lugar. Cederam a motivações de ordem preterintencional (preterdolo). Foram eles que iniciaram o processo de colonização precipitadamente antecipada desse planeta. Seduzidos que estavam pela possibilidade de orientar seus conhecimentos para submeter e escravizar seus primitivos habitantes, fazendo-os construir as bases de dominação de um império galáxio.

Um império que, supostamente, lhes permitisse partir, num dia muito futuro, em direção a outros sistemas solares, viajando em naves que seriam (ou serão) construídas para viajar próximas à velocidade da luz.

Antes disso, estabeleceriam colônias interplanetárias que serviriam (ou servirão) de base para viagens posteriores rumo a outros sistemas planetários em outras galáxias.

Naquela ocasião primeva, teriam de ter retornado à nave-mãe. Preferiram a desobediência e ficar aqui, numa antecipação algo catastrófica do desenvolvimento biológico dos espécimes locais, porque fora das projeções iniciais para o crescimento cultural gradativo do indivíduo representativo do gênero (biótipo) diferenciado, habitante selvagem desse planeta.

Esta desobediência gerou represálias posteriores. A caça e destruição dos núcleos de colonização dos transgressores. Seus planos de poder foram gradativamente malogrados. Sabotadores se infiltraram em suas colônias de modo a solaparem os planos de estabelecimento de uma cultura que os pudesse reconduzir ao espaço.

Seus projetos de conquista espacial foram malogrados naquela idade da Terra remota e paradisíaca. E são malogrados ainda agora.

As sondas espaciais Viking I e II, Pioner 10 e 11, a Voyager e a Galileu, com geradores de eletricidade movidos a plutônio, acondicionadas em cápsulas de irídio, metal extremamente resistente, capaz de resistir a uma explosão tipo a que vitimou o ônibus espacial Challenger, em janeiro de 1986, deveriam, segundo os planejamentos iniciais, ter sido construídas muito antes das datas de seus lançamentos atuais.

Estaria Klone outra vez, através de um ato de desobediência, condenando-se ao malogro? Acredita que não. Sua intenção é muito outra. Seu interesse em permanecer na Terra visa o registro de patentes industriais que permitirão recuperar o tempo perdido na deterioração dos ambientes e recursos naturais em todo o planeta. Inclusive na selva amazônica e nos oceanos.

Se algo não for feito urgente neste sentido, a cultura de bactérias, vírus e outros microorganismos que atualmente estão em estado de periculosidade virtual, há de se proliferar de modo que os senhores deste planeta em breve poderão ser outros que não os burgueses detentores do poder econômico e político atual.

Aqueles que ficaram em tempo remoto, foram motivados pela ambição de domínio e conquista. Imaginavam que poderiam, através do trabalho escravo, submeter a mão-de-obra planetária a seus desígnios. Os seres humanos eram vistos apenas como matrizes de uma raça escravizada a trabalhar para a realização de suas ambições de dominação territorial e colonização planetária.

A patologia da dominação desses seres se deteriorou ao longo do tempo. Eles viram que não seria possível realizar suas projeções de autoridade, posse e senhorio. O Velho e o Novo Testamento seriam uma narração de como a mentalidade desses antigos dominadores entrou em um processo histórico deletério e irreversível. Não fosse a vinda de Cristo.

É certo que os atuais líderes mundiais saíram a seus antecedentes. E quem sai a seus antepassados degenera irremediavelmente. Daí o perigo iminente a que este planeta está exposto, em mãos do mesmo modelo primitivo de cobiça, ambição, avareza.

A natureza das modificações estruturais e/ou funcionais produzidas pela doença (ideológica) do capital é uma peste negra real e virtual que se alastra nos corações e mentes, viciando, corrompendo, contaminando, exasperando os ânimos daqueles remanescentes que ainda clamam por uma sociedade ética. Estes, são minoria da minoria. Por eles, esse planeta ainda não acabou.

Desde que seu vôo saiu de Nova York ("A Grande Maçã"), Klone faz exercícios heurísticos de imaginação. Dirigindo este utilitário da Ford, a noventa quilômetros, concluiu estar sendo seguido. Os faróis de uma camioneta cabine dupla, com quatro agentes especiais, estavam sempre à vista. Klone continuou a manter a velocidade moderada.

Esses elementos são certamente membros das agências dos serviços de inteligência dos Estados Unidos. Estão rastreando seus passos há algum tempo. Querem-no capturar, pensam poder enjaulá-lo numa de suas prisões subterrâneas para "aliens", após submetê-lo a experiências médicas de invasão investigativa.

Essas equipes de inteligência costumam usar um engenho gerador de campo eletromagnético a partir do qual analisam a ressonância térmica do indivíduo em perseguição. A engenhoca traduz os resultados da análise em um microcircuito fechado de televisão. Esse mecanismo eletrônico permite que possam segui-lo a uma distância razoável sem que causem suspeitas.

O "thermal sensing by infra-red television" pode identificá-lo a uma distância de dezenas de quilômetros. A presente, ostensiva perseguição, só se justifica pela intenção de capturá-lo. A pista de pouso da nave está próxima, melhor que permaneçam na área externa de segurança, longe do engenho estelar.

Klone pára o veículo e ao vê-los aproximarem-se, aciona o câmbio na marcha ré do carro, e pisa fundo no acelerador. A perua manobrou para a esquerda visando sair da linha de atrito. Por pouco não colidiu e o motorista teve de manobrar para que o carro voltasse a girar nas quatro rodas sobre a pista dupla.

O Alien manobrou no sentido de fazer o utilitário emparelhar com o outro carro, antes de passar para o teto deste, no qual estende o corpo e fica com a cabeça voltada para baixo, encarando do lado de fora do pára-brisa os rostos assustados de seus perseguidores. Da fixação da íris na pupila deles, obtém imagens mentais dos mesmos. Klone agora sabe o que eles sabem sobre ele e sobre a nave.

Enquanto o carro sem governo esbarra violentamente contra um caminhão de carga que rodava em sentido contrário, Klone salta do teto do carro dos agentes federais americanos, enquanto eles crivam de balas a parte superior interna do veículo visando atingi-lo de qualquer jeito. O motorista tenta dominar a caminhonete desgovernada que por pouco não se esborracha contra o caminhão que havia feito uma manobra no sentido de evitar o choque frontal com o outro carro e trafegava pela contra-mão da auto-estrada.

O agente que estava sentado no banco ao lado do motorista conduz a parte superior do corpo através da janela após berrar para o outro abrir o vidro automático da porta. Tinha uma arma especial das forças do FBI em punho quando apoiou a parte superior do corpo no teto externo do carro. A camioneta com os quatro agentes de duas instituições do serviço secreto oscilava perigosamente da esquerda para a direita e da direita para esquerda do carro, sem que o chofer conseguisse controlar a rota do mesmo.

Outros veículos passavam ao lado desviando da trajetória de impacto. Para não cair no asfalto, o agente se equilibrava com dificuldade, até, afinal, voltar ao assento. Enfurecido exclama em voz alterada:

Pára essa merda de carro, o alienígena desapareceu.

Outro agente tentou acalmar os ânimos dizendo que estava tudo certo, fixando os olhos ao mesmo tempo que manipulando um pequeno monitor de ondas curtas.

Ele está por perto, nós o alcançaremos.

Um dos monitores de vídeo duplo mostrava o deslocamento de uma imagem luminosa em direção Norte. Exasperado pela velocidade continuada do veículo, o agente ao lado do motorista, ainda com a arma na mão, puxava o freio de mão, enquanto o chofer pisava inutilmente no pedal do freio. A tensão começou a diminuir quando, afinal, a caminhoneta começou a diminuir a velocidade e o motor travou.

Saltaram apressadamente do carro, ainda aturdidos pelo inusitado do acontecimento. Seus superiores lhes pagavam para que fossem competentes e obedecessem as suas ordens. E a ordem do comando da missão era clara: "Capturem o Alien vivo ou morto".

O "thermal sensing" em poder dos agentes mede os deslocamentos da energia térmica transformada em trabalho mecânico. Seguir Klone com este detector ultra-sofisticado de energia térmica é passatempo de criança. Quase tão fácil como dirigir um aeromodelo por controle remoto.

Klone caminha em direção a nave. A velocidade de seu raciocínio está plugada em várias direções simultaneamente: seus ancestrais traíram o plano piloto dos Mestres quando optaram pela permanência não autorizada neste planeta. Estavam totalmente fascinados pela possibilidade de virem a poder ser os senhores absolutos e incontestáveis deste sistema solar de quinta grandeza. Naquela época este lugar era um paraíso.

Agora, pergunta-se, que restou de paradisíaco neste planeta, se seus habitantes estão submersos emocionalmente numa maré de consumismo que controla os níveis do psiquismo, lhes determina a vontade de agir como se gostassem de ser baratas de shopping? Logo que os grandes conglomerados lançam uma nova novidade tecnológica, as pessoas de todas as idades logo querem comprar e dominar a tecnologia, o brinquedo do dia, como se isso fosse a coisa mais importante de suas vidas. E a propaganda faz com que isto seja verdade incontestável.

Por motivos outros, agora chegara sua vez de "desobedecer" ao plano dos Mestres. Era uma "transgressão" diferente. Estava seguro de estar usando seu livre arbítrio. Fazer a opção de habitar neste planeta era como descer mil degraus na escala de evolução das espécies. Teria de renunciar a mil privilégios e carregar a cruz de estar entre seres que ainda nem sequer saíram do estágio de primatas semiiformes. Hominídeos.

Klone chega às imediações do campo de pouso da nave. A localidade se ressentia de intensa atividade magnética. Em condições normais, os habitantes do arredores,no exercício rotineiro de suas vidas normais, temem aproximarem-se da geografia deste lugar na Serra do Mar. Nem aventureiros, camponeses ou caçadores gostam dessas imediações. Estava seguro de que o campo magnético da nave reforçava o poder natural do lugar. Daqui não se aproximam turistas, curiosos, marginais ou outros elementos da fauna local.

Estava sendo seguido, porém, aqueles que estão em seu encalço terão de se debater com alguns problemas de eletromagnetismo no funcionamento de seus equipamentos de rastreio. A garantia de que estará a sós com seus semelhantes. A desorientação daqueles que lhe querem capturar está garantida. Havia realizado de maneira proveitosa as pesquisas. A reconfortante sensação do dever cumprido.

Partes das pesquisas versavam sobre as influências que estão precipitando este planeta em direção a um holocausto sem precedentes em sua história, desde seu passado mais remoto. Uma raça planetária pode reivindicar o direito de autodestruir-se, porém não de forma a destruir também outras formas de existência, milhares, milhões de espécimes vegetais, animais, que foram trazidas para este planeta posteriormente às inseminações artificiais que geraram as mutações genéticas desde a primeira raça raiz.

Os Mestres têm autorização de intervir nos acontecimentos autodestrutivos, uma vez que essa autodestruição está sendo precipitada por "aqueles que não sabem o que fazem". Lideranças planetárias sem nenhum escrúpulo, nenhuma ética. A energia coletiva inconsciente desse planeta tende a crescer e a desenvolver-se destrutivamente.

As lideranças planetárias atuais pensam poder controlar os fluxos de inconsciência que determinam a data limite do maior de todos os holocaustos. Sistêmico.

Klone raciocinou que, uma vez pertencendo à energia coletiva planetária, sendo parte da população dessa Terra, poderá, talvez, intervir em seus acontecimentos, sem desobedecer os princípios que regem a comunidade cósmica. Há uma única maneira de conseguir isto: passar pelo ritual de aniquilação ancestral: forma e conteúdo, essência e aparência, terão de retroagir a um estágio passado de evolução animal da espécie Homo sapiens.

Enquanto sua forma e essência anterior se diluem, terá de encontrar em noventa segundos, a projeção astral de um corpo físico, humano, razoavelmente saudável, no qual possa acoplar em seu conteúdo astral e se adaptar à sobrevida deste. A adaptação deve durar um período de tempo de pelo menos duas décadas.

Ao findar este intervalo, um descendente dessa espécie precisa ser gerado em um útero materno, de modo que a criança por nascer possa ter condições de adaptação e sociabilidade.
Não será tarefa fácil. O tempo trabalha contra os seres humanos habitantes deste planeta no sentido da própria preservação do potencial físico e psicológico, em decorrência das deteriorações mental, física e ambiental.

Poderá permanecer neste planeta em sua nova forma, e plantar a semente de uma nova geração. Ainda terá de realizar, em uma única estirpe, transferências de interesses que não são exatamente aqueles dos que hoje detêm o poder político e econômico. É um trabalho de estiva intelectual e moral. Quem sabe possível de realizar. Só o tempo futuro dirá.

O povo desse planeta nunca viveu harmonicamente. A história do homem dessa terra á a história da destruição de seus semelhantes para fazer prevalecer interesses contrários de uns aos outros. E pior: é a história da tortura de seus próximos para fazer prevalecer a natural ira de sua natureza ancestral. O conto bíblico de Abel e Caim é prova disso.

Se estiver sentenciado a não ser emocional e racionalmente eficiente, estará condenado a todo o resto de sensações e percepções deletérias. A construir uma sociedade à sua imagem e semelhança destrutiva, nociva, corrompida em todas as suas instâncias. Inclusive as de seu psiquismo.

Klone manteve-se à distância da nave. Parou. De seu campo de força omegamagnético depende, muitas vezes, a integridade física de seus tripulantes. Se em certas condições adversas um deles se afasta dos limites externos das influências desse campo, inadequadamente seria arremessado de volta a seu espaço originário.

UFOs existem que não são naves de pesquisa e transporte convencionais. Podem ser observados, porém sua função é a de produzir curvaturas no "continuum" interestelar. Ou no hiperespaço, como diriam alguns escritores de ficção-científica. Viajar pelo "continuum" interestelar é vital para qualquer starnauta que tenha de percorrer distâncias superiores a alguns milhares de anos-luz, ou milhões, entre estrelas.

A estrutura essencialmente tridimensional do espaço pode ser curvada na quarta-dimensão. Observe duas estrelas distantes entre si mil anos-luz. Qualquer pessoa que viajasse entre as duas estrelas chegaria numa delas mil anos depois de percorrer a distância entre elas. Ninguém vive mil anos. Nem sequer um décimo dessa idade, nas atuais condições de sobrevivência nesse planeta.

Viajar pelo hiperespaço pressupõe a existência de força propulsora que mantenha a nave em movimento no espaço tridimensional, navegando numa diferença constante de potencial, paralela à quarta dimensão. Próxima à velocidade da luz.

A quarta dimensão, o tempo, não será detectada no interior do espaço de três dimensões da nave. Há tecnologias que permitem viajar a velocidades superiores à da luz. Esta, é considerada limite pelos decanos da física teórica contemporânea nesse planeta.

No início da corrida espacial nesse lugar primitivo, pouco ante de produzir o primeiro satélite artificial, os sábios ocidentais mais eminentes concluíram que seria realmente impossível, com os recursos tecnológicos então disponíveis, fazer girar em órbita terrestre um satélite artificial.

Mal terminou o Congresso, e as conclusões dos grandes sábios das exatas no ocidente se evidenciaram anacrônicas, desmentidas pela evidência do Sputnik. A habilidade mental do Homo sapiens, no sentido de criar mitologias, é praticamente sem limites. Num momento surgem "verdades" científicas consensuais e estas são desmentidas com igual facilidade à maneira que surgiram.

Esses pensamentos do Alien fluíam de imagens simultâneas de múltiplos interesses. Klone estranha que cientistas desse lugar queiram explicar a origem da raça humana a partir das conclusões do darwinismo, e não pela intervenção extraterrena, a partir da qual grupos pioneiros dispostos em equipes, trabalhando simultaneamente em vários lugares desse globo, disseminaram as primeiras intervenções biológicas no sentido de provocar mutações primigênitas.

A teoria darwiniana de origem comum de todos os seres vivos, com a formação de novas espécies a partir de um processo de seleção natural, não é difícil de concluir que se trata de uma fraude cultural. Uma das razões pelas quais não são descobertos artefatos extraterrenos neste planeta, está na evidência de que os arqueólogos e outros cientistas, não crêem que existam. Os movimentos orogênicos da litosfera não permitem que tais evidências persistam por muito tempo sobre a camada geológica da crosta terrestre.

Uma nave menor se aproxima como um ponto de luz cada vez mais intenso, até pousar,permanecendo a doze metros do solo. Em segundos Klone estava no interior por teletransporte. Alojou-se numa micro célula giratória, numa cabine alaranjada, após passar pela câmara de áscua, onde se limpou de qualquer microorganismo exterior ao ambiente da nave.

Visualizou o processo antes de vivenciá-lo. Raros exemplares de sua raça, poder-se-iam contar nos dedos de uma mão, haviam se submetidos a esse trâmite, essa metamorfose mitológica, quase que inexplicável. Os olhos se fixaram num espelho vibratório do tamanho de uma bola de tênis.

O desenho externo em espiral. Do centro aparente começaram a fluir linhas de cores ultradefinidas.
O epicentro da espiral começou a deslocar-se ora numa, ora noutra direção supostamente aleatórias ao espaço tridimensional exterior. Logo esses espaços se confundiam. E seu corpo parecia que provinha de todos os lugares. A velocidade de deslocamento do centro da espiral da circunferência gradativamente aumentou até que, súbito, parou.

Um dos milhares de micro monitores que estavam a sua frente fragmentou-se. Seus pedaços, estranhamente, após fragmentarem-se, tornavam a se recompor. Desta forma milhares de outros micromonitores esfrangalhavam e ao mesmo tempo reorganizavam-se, quase que simultânea e ininterruptamente.

Uma voz se faz ouvir. Traz em sua sonoridade milhões de anos-luz de ternura por ele, Klone, e supostamente por todos os seres, de todas as possíveis Vias-Lácteas: Há dois milênios, neste planeta, um Alien se sacrificou em nome de toda essa comunidade. Seu sacrifício não fora em vão. Fundara uma religião consistente. Uniu milhões de seres humanos numa aliança de fraternidade universal.

Você confia, talvez, que estará continuando este trabalho? Você está certo de que sua utopia merece apoio. Que tornará mais efetivos os resultados. Seja feita segundo sua vontade.

O Alien cainhou até uma figura geométrica circular que brilhava no centro do piso da sala pouco abaixo do nível do solo. A espiral sob seus pés começou a girar, enquanto o corpo continuava suspenso a poucos centímetros do piso. Compreende que parte informatizada de sua energia biológica está sendo drenada para os arquivos de tripulantes da nave. Enquanto uma réplica da mesma é dirigida até aquele trabalhador terreno, que atende pelo nome de Sereno.

A fala continuou compreensiva e preternatural, como se, pela última vez estivesse a tentar chamá-lo à razão: Klone, é isso mesmo que você quer? Não deseja rever sua atitude? Você recorda quais as posturas do extermínio voluntário? Os Ásanas da Morte? Sinônimo de seu amor por este grão de areia da Via-Láctea? Filho bem amado, guerreiro da Virtude, Órfão de tudo e de todas as coisas. . . Adeus!

Não soubesse a seqüência exata dos ásanas, não poderia obter a rápida intensificação da atitude intelectual e perceptiva consciente. A inconsciência que precede a morte, o coma, pode ser vencida por, no máximo, noventa segundos após a cessão da energia vital que sucede a morte física e mental.

Fragmentos brilhantes de cor prateada começaram a brotar, com intensidade radiante, do espaço ao redor de seu corpo. A luminosidade densa compactou-se se deslocando rumo a algures. Fora da nave uma garoa ácida amanhecia sobre a cidade que madrugava. Sobre os edifícios, casas, parques, ruas praças e avenidas da cidade. Descia das nuvens impertinente e copiosa umedecendo a paisagem urbana do amanhecer.

Neste momento Sereno introduzia seu cartão magnético de reconhecimento profissional na linha vertical no centro de um dispositivo eletrônico. A trava da porta se abriu. Ele se dirigiu para o elevador que o conduziu ao centro da garagem subterrânea. Caminhou até sua moto. Abriu o cadeado que trancava duas argolas da corrente, girou a chave na ignição, destravou o volante e acelerou.

Ao formigamento do pé, intenso e cômodo, visualizou estupefato, milhares de pequenos aros pulsantes, de aparência cristalina, cintilando, resplandecentes. Pareciam brotar da sola dos pés, irradiando-se ao redor de todo o corpo. O efeito luminoso perdurou por 45 segundos de estupor dos sentidos. A paralisia repentina de repente cessou.

Perplexo, indagou-se que coisa havia acontecido. Seria estafa? Talvez. Essa sensação de formigamento fora realmente muito intensa. Vendera as férias por dois períodos contínuos. Tinha de sair da rotina. Passado o efeito não reforçou o estranhamento inusitado. Sentiu-se disposto.

Aumentou a velocidade da moto de modo que estava em seu apartamento em tempo recorde.
Entra no apartamento como se já houvesse esquecido as ocorrências de há pouco. Depois de um banho quente voltou-se para as formas bem delineadas do corpo de Luna deitado despido sob o lençol. Apesar da garoa, o quarto estava como que aquecido pelo friozinho contido do ar refrigerado. Um odor suave de jasmim brotava do corpo dela, um convite para o chega mais, a troca de carinhos, a insensatez de Baco, a contenção de Bach.

Luna, apesar de baixa e morena, era sueca. Seus olhos refletiam algum mistério abissal, oceânico. Formou-se em oceanografia tendo vivido alguns anos na Índia, a princípio em Bombaim, depois em Cachemira. Em Goa afirmava ter encontrado as pessoas mais excêntricas que possam existir no mundo. Viveu de amor e aventura.

Conheceu um biometereologista brasileiro que fazia estudos sobre como algumas pessoas sensíveis são capazes de, com dias de antecedência, prever mudanças de clima, terremotos, tempestades e "tsunamis". Os sinais de advertência são dores na cabeça, inquietação impertinente, pequenas ondas de calor na coluna vertebral e no plexo solar. Luna acreditava que as condições atmosférica têm a propriedade de deprimir organismos animais e humanos, ao mesmo tempo que provoca certa excitação mórbida. De Goa foram a Java, na Oceania. E terminaram, Luna e seu companheiro, no Brasil onde se separaram.

Felizmente, pensava Sereno, ela está aqui, em minha cama. Deslizou as mãos por debaixo do colchão e começou a esfregar, massageando a palma de leve por sobre a superfície da pele macia. Desceu a mão destra entrecochas, enquanto lambia suavemente o bico dos seios com a ponta da língua. Introduziu os dedos na vulva que se abria entre murmúrios dengosos saídos luxuriosos, da garganta de Luna Maria. E nenhum dos amantes se economizou.

Depois de tudo, Klone (ou Sereno, ou uma simbiose de ambos?), sentiu-se ainda mais energizado. Contemplou a paisagem do amanhecer que se desdobrava a partir do espaço da janela. Uma intensa nostalgia se apoderou de seus reflexos, assim como uma curiosidade impetuosa que o conduziu até a varanda e o fez ficar a olhar inexplicavelmente janela afora, a linha do horizonte, em busca da visualização de algo que não sabia o quê.

Ao meio-dia adormeceu. Uma série de sonhos recorrentes surgiu em sua imaginação onírica. Sonhou fazer parte de uma equipe de cientistas que aprisionava provisoriamente espécimes símios do sexo feminino para fecundá-los com o sêmen de uma raça biologicamente compatível com a deles, mas numa fase ulterior de desenvolvimento molecular, de modo a acelerar os mecanismos de atuação dos biopolímeros, esporos protéicos e ácidos nucléicos. Provocando desta forma, mutações genéticas a longo prazo.

Ele fazia parte dessa equipe de colonização e pesquisa biogenética que promovia uma série de experimentos com vistas a testar a força física de alguns espécimes do sexo masculino, que ficavam em piscinas sem borda, até os limites máximos da resistência física. Eram feitos exames de sangue, trepanações de crânio, testes isomórficos, híbridos e de heteronomia (autodeterminação).

Por vezes populações (tribos) inteiras eram transportadas para colônias experimentais de enraizamento, quando de suas condições de sobrevivência os cientistas podiam obter melhor expectativa de desenvolvimento, depois de definidos os níveis de têmpera física e demais condições de sobrevivência, a exemplo do antropomagnetismo dos exemplares pesquisados.

Centenas, por vezes milhares de anos se passavam, até que novos grupos voltassem outra vez, visando confirmar as condições de sobrevivência anteriores, proteção da espécie, sociabilidade, evolução ou retrocesso: enfim, as condições que originaram a civilização dos povos da Terra.

Os pensamentos e imagens suscitadas por esses sonhos eram realmente estimulantes. A rotina informatizada de Sereno era bem mais monótona. Que significavam esses hieróglifos oníricos? Teriam alguma influência em sua vida futura? Sentia-se melhor e mais disposto. Acreditava que esses sonhos eram presságios de uma vida mais íntima, antigas, que fluía para fornecer-lhe forças extras. Forças que prenunciavam sua participação em eventos fantásticos dos quais talvez estivesse participando quase que involuntariamente.

Respirava um ar renovado, uma nova sensação de liberdade. A aflição espiritual e o questionamento existencial estavam em segundo plano agora.

Havia paz em sua vida interior. A semente de uma esperança inexplicável crescia em seu coração e em sua mente. Fazia justiça ao nome: Sereno. E ao nome daqueles que seriam seus descendentes. Ninguém poderia jamais penetrar tão fundo em seus pensamentos, a ponto de poder captar suas reais intenções: a extinção da raça arcaica. Dos seres programados por um conjunto de motivos que direcionava sua vontade pessoal e coletiva, e a conduzia a um beco sem saída da história inconsciente. Sim, por que até este momento, a História desse planeta foi feita por descendentes primatas movidos por forças físicas e psicológicas totalmente desprovidas de ética racial. Raça no sentido de povo da Terra.

Na madrugada seguinte, ao voltar para casa, parou a moto na entrada da garagem do edifício. Tirou o capacete da cabeça, voltou a olhar para o alto com aquela intensidade presciente, estranha, inusitada, o espaço vazio, as nuvens do céu em meados de outubro não mostravam nada. Mas ele estava buscando ver algo que não sabia exatamente o que seria. Estacionou a moto na vaga do apartamento. Luna estava vendo tv do sofá-cama.

O rádio estava sintonizado numa estação FM. Ouvia-se a canção "Earth is never satisfied". Alguns versos da letra calaram fundo nele, como se seu significado fosse muito além do que as imagens da música sugeriam: "A Terra nunca está satisfeita / Ela está sempre devorando / Nossos homens e mulheres / Nossos filhos e avós / Todos eles estão sob sete palmos de chão."

Abriu a cortina da janela e contemplou o firmamento, intrigado. A avidez do espectador que deseja visualizar algo mais do que a paisagem costumeira. O sol surgia na linha do horizonte. Observou com admiração e assombro, como se fosse algo estranho e familiar ao mesmo tempo, um enorme objeto voador não-identificado movendo-se em direção às estrelas. Seu diâmetro, oitenta metros talvez, distanciando-se dele, da Terra. Uma angústia aparentemente inexplicável pareceu abarcar todo o espaço interior do apartamento. De seu coração. De sua Terra.
DECIO GOODNEWS
Enviado por DECIO GOODNEWS em 06/04/2010
Alterado em 24/04/2010


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